Aindra
Dasa: Ainda Vive em Som
Por Madhava Smullen para ISKCON News em
24 de Julho de 2010
[Tradução:
David Britto 29/12/2010]
Email:
radhesyamaji@yahoo.com.br
Verão de 1973. São 8:00, e embora a
capital Washington DC esteja fervilhando de atividade, já que todos se apressam
para o trabalho, um grupo de devotos da ISKCON também deixa seu templo,
cruzando a Rua Q e indo para a Avenida Connecticut, um bairro comercial
altamente povoado. Mas o trabalho deles é diferente: enquanto andam, eles
cantam kirtan, um antigo estilo de responsório Védico de canto dos Santos Nomes
de Deus.
De repente, um jovem camarada aparece
de lugar nenhum, uma flauta enfiada embaixo do braço e um longo cabelo vermelho
escorrendo atrás dele enquanto corria o
mais rápido que podia tentando alcançá-los. Os devotos estavam surpresos e
encantados.
Então, assim que ele estava quase os
alcançando, o jovem rapaz perde uma de suas sandálias de dedo. Os devotos
mostraram-lhe que ele deveria voltar e pegá-la, eles o esperariam. Mas ele
recusou. De forma nenhuma ele arriscaria perdê-los ou não participar de até mesmo
alguns segundos do kirtan.
Ele se junta ao grupo de kirtan e
naquele mesmo dia se muda para o templo. O nome do jovem camarada é Eddie –
mais conhecido dos devotos da ISKCON ao redor do mundo como Aindra Dasa – e
daquele dia em diante ele nunca mais parou de cantar Hare Krishna.
Descobrindo
a Música do Mundo Espiritual
Tendo crescido em Haymarket, Virgínia,
nas décadas de 1950 e 1960, Eddie Striker era um artista faz-tudo desde cedo,
pintava, desenhava e fazia seu próprio ornamento. Mas era a música que estava
mais perto de seu coração.
Ele era de uma família musical – seu
pai se apresentou com grupos bluegrass,
sua mãe tocava harpa e seu irmão era um baixista. Eddie, de sua parte, amava
Jimi Hendrix e era afeiçoado pela guitarra elétrica.
Então, quando sua família se separou em
1971 ele se mudou para Chevy Chase, Maryland, foi para a guitarra que ele se
voltou, tocando com uma séria de bandas e começando a fazer um nome para si.
“Mas ele sempre teve um espírito que
estava além da vida mundana que ele estava vivendo até ali,” diz seu irmão,
John. “Não demorou muito para que ele visse o bastante da vida das estrelas do
rock e para onde isto levava – a morte de Jimi Hendrix foi um golpe singular
para ele – e ele sabia que havia um buraco que precisava ser preenchido pelo
espiritual, não pelo material.”
Descobrindo a música bastante diferente
do mundo espiritual, Eddie mudou-se para o templo da ISKCON em Washington, D.C.
e logo depois, em fevereiro de 1974, no auspicioso dia da instalação de Sri Sri
Gaura Nitai e do aparecimento do Senhor Nityananda, ele foi iniciado pelo
fundador da ISKCON Srila Prabhupada e tornou-se Aindra Dasa. Embora seu pai estivesse
zangado com essa mudança drástica em sua vida, o irmão menor de Aindra estava
feliz por ele e alegre que ele havia encontrado sua vocação.
“Eu tinha apenas nove ou dez anos, mas
quando ele nos visitava ele me trazia o Bhagavad-gita e outros escritos e estes
lindos pôsteres,” diz John. “Meu quarto tinha coisas de Krishna por todo lado.
Muitas vezes ele me trouxe tambor e cimbalos e nós tocávamos e cantávamos. Ele
já era um líder espiritual naquela época porque ele me conscientizou de outras
coisas além do modo agnóstico em que fomos criados e me abriu para meu próprio
caminho espiritual.”
De volta ao templo, Aindra tornou-se
conhecido também como erudito pregador – ele se juntou a todos os outros na
distribuição de livros nas ruas, adorava falar com os visitantes no Festival de
Domingo semanal e estava sempre buscando por um modo de espalhar a consciência
de Krishna.
Seu singular humor e amor por kirtan
também emergiram cedo. “Nossos visinhos costumavam reclamar sobre nosso Mangal Arati
Kirtan de 4:00,” diz Jagara Dasa que também serviu no templo de D.C. na década
de 1970. “Mas quando Aindra puxava o canto – o que ele fazia muitas – ele tinha
a restrição necessária para manter o kirtan aonde ele precisava ficar para que
a polícia, que se sentava do lado de fora, não entrasse e nos desse uma grande
multa.”
Inaugurando
o Kirtan 24-Horas
Mais tarde, Aindra tornou-se um
sacerdote de Radha-Madhan Mohan e Gaura Nitai e tocaria harmonium entre os
serviços, logo trabalhando sua primeira melodia: a canção curta de Bhaktivinode
Thakura Jaya Radha Madhava.
Ele continuou a praticar e sua
habilidade e amor por kirtan cresceu. Mudando-se para a cidade de Nova Iorque
ele converteu um caminhão no que se tornou um ornado templo dourado. Seu som
adquirido lhe permitiu ir para diferentes partes da cidade onde ele poria seu
caminhão e realizaria kirtan por oito horas ao dia. Suas performances eram
impactantes, inspirando várias pessoas a entrarem na ISKCON.
Finalmente, Aindra decidiu que gostaria
de tentar organizar o programa de kirtan na Índia. Viajando para a terra natal
do Senhor Krishna em 1986, ele aprendeu a história do programa de Kirtan
24-Horas do Krishna Balarama Mandir. Ele tinha sido primeiro introduzido em
1975 pelo fundador da ISKCON Srila Prabhupada – mas, sem a administração
apropriada, ele começou a esmorecer, e por volta de 1978, um ano depois que
Prabhupada partiu, ele parou.
Aindra decidiu dedicar-se ao projeto.
Ele começou a absorver a atmosfera de Vrindavana, conectar-se com outros
kirtaniyas e a aprender a música clássica indiana ou ragas, ensinando a si
próprio as melodias tradicionais de ouvido. E oito anos depois que o Kirtan
24-Horas tinha desaparecido ele o reconstituiu como um departamento próprio,
organizando um grupo núcleo de entusiastas de kirtan para garantir sua
continuidade.
O Kirtan 24-Horas do Krishna Balarama
Mandir tem ocorrido sem parar, 24-horas por dia, 365 dias por ano, desde então.
Alguém
Que Verdadeiramente Se Importa
Não havia como negar a austeridade do
programa e por isso Aindra escolheu homens para sua equipe que, assim como ele,
agüentariam em todas as condições.
A posição da sala do templo, próxima à
um pátio, e os “kirtaniyas” – a maioria estudantes celibatários, conhecidos
como brahmacharis – tinham que tolerar o impiedoso clima de Vrindavana: seus
verões sufocantes, com temperaturas subindo até 45 graus Celsius (113
Fahrenheit) e suas frias noites de inverno.
Como os dezesseis homens do
Departamento ainda fazem agora, eles dormem no chão ou em beliches simples na
Escola Internacional de Vrindavana, em quartos com paredes rebocadas com
esterco de vaca. Eles guardavam todos os itens pessoais em uma prateleira.
Naqueles tempos eles nem mesmo tinham ar condicionado. Tudo o que tinham era o
Nome do Senhor Krishna.
E o kirtan era a vida deles. Os membros
de tempo integral faziam (e ainda fazem) seis horas de kirtan todo dia, como
também cantam Hare Krishna em suas contas de japa por duas horas. Cada um deles
pegava dois, dos turnos de três horas do Kirtan 24-Horas, que começa 1:00 e
segue continuamente. O kirtan segue mesmo durante os serviços do templo tais
como oferecimentos de aratis e aulas, com kirtaniyas cantando suavemente “japa
kirtan” em suas contas de orações.
Madhava Dasa, um devoto da segunda
geração, que agora viaja o mundo, tanto sozinho quanto com sua banda de bhajan
Gaura Prema, fazendo kirtan, estava entre os primeiros membros do Departamento,
tendo entrado quando ele tinha apenas dezoito anos.
“Aindra Prabhu era tudo para mim: um
pai, uma mãe, um guru,” ele diz. “E ele me ensinou muitas lições valiosas. Logo
que eu comecei, eu tinha muita energia e ego e pensava que eu era o melhor
mridanguista. Ele me punia por isso constantemente, duas ou três horas por dia
literalmente. Eu achava que ele estava sendo severo demais comigo e finalmente
eu disse, ‘Aindra Prabhu, você ache outro mridanguista – eu tocarei kartals.’
“Mas ele respondeu, ‘Não, eu quero que
você toque mridanga e Radhe Shyam também quer. Eu estou fazendo isto apenas
para seu próprio bem — se você ouvir o que eu digo, você irá longe em seus
kirtans.’ Eu concordei em tentar e sacrificar meu ego e depois daquilo o kirtan
com Aindra Prabhu tornou-se muito doce. Algumas pessoas não gostavam do Aindra
porque ele era muito pesado, mas eu apreciava sua franqueza e honestidade e
falta de superficialidade. Quando ele era pesado comigo eu pensava ‘Nossa, aqui
está alguém que realmente se importa comigo.’”
A
Revolução do Kirtan
Aindra e Madhava tornaram-se uma equipe
unha e carne. “Aqueles foram os melhores anos de minha vida, os mais lindos
kirtans,” diz Madhava. “Eles estavam perfeitamente no humor adequado. Eu
aprendi com o Aindra que o kirtan não é para impressionar ninguém — é nossa
forma de expressar nossos sinceros sentimentos por Radha e Krishna e Srila
Prabhupada e nossa gratidão por ser capaz de executar kirtan e nos conectarmos
com nosso único abrigo.”
Madhava acredita que esta abordagem do
kirtan foi o que fez os álbuns que se seguiram tão poderosos. Primeiro veio o
álbum duplo Chintamani Nama Parts 1 e 2. Depois veio o primeiro álbum
“Vrindavana Mellows”.
“Com a tecnologia muito básica
disponível em Vrindavana e os freqüentes cortes de energia outros poderiam ter
ido gravar em um estúdio em Delhi,” diz Madhava. “Mas Aindra queria gravar
Vrindavana Mellows em Vrindavana. Ele disse que cada kirtan feito em Vrindavana
é mil vezes mais poderoso do que um kirtan feito em qualquer outro lugar e que
ele queria dar Vrindavana para os devotos ao redor do mundo.”
Levou seis meses para gravar Vrindavana
Mellows Part 1, mas quando ele finalmente apareceu, em 1993, ele arrebatou o
mundo dos devotos e criou o que Madhava chama de “uma revolução do kirtan.”
“Aqueles álbuns mudaram tudo”, diz o
amigo e colega de Madhava, Gopala Dasa, da segunda geração de devotos, que tem
feito parte do Kirtan 24-Horas desde 2000. “Antes deles, o modelo antigo, da
década de 1980, o estilo de kirtan um-dois-três predominava. Vrindavana Mellows
introduziu uma abordagem mais clássica em acordo com os padrões básicos Gaudiya
Vaishnavas — com mais diferentes variedades de ritmos, toques de karatala e
melodias raga.”
Vrindavana Mellows Partes dois e três
se seguiram em 94 e 95, inspirando muitos devotos a se juntarem ao Kirtan
24-Horas em Vrindavana e encarar o kirtan mais seriamente do que antes.
Possivelmente, os mais entusiásticos
receptores desta dádiva foram os da segunda geração da ISKCON, conhecidos como
gurukulis.
“Nós crescemos fazendo kirtan — isto
está em nosso sangue”, diz Madhava. “E nós encontramos em Aindra um espírito
assemelhado, alguém que amava kirtan tanto quanto nós amávamos. Mas nós também
encontramos alguém em quem podíamos tomar abrigo, uma figura paterna. Nós o
amávamos. Sempre havia um bando de gurukulis rodeando-o, tocando mridanga e
kartals e cantando. Ele mudou nossas vidas.”
Este amor também era reciprocado por
Aindra. Depois de mais quatro álbuns – o álbum gravado espontaneamente ao vivo
Kirtan is Our Bhajan, o de 1996 Prayers to the Dust of Vraja e o de 1998 Vraja
Vilasa Partes 1 e 2 - e sete anos com o
Kirtan 24-Horas, Madhava finalmente foi para o quarto de Aindra para dizer-lhe
que ele partiria para se casar e começar uma família.
“Havia lágrimas em seus olhos,”
lembra-se Madhava. “Ele disse, ‘Eu treinei você e agora você está me deixando.’
Eu lhe disse, ‘Aindra Prabhu, você encontrará alguém.’ Ele disse. ‘Sim, mas eu
nunca acharei alguém como você.’ Então ele me disse para cantar Hare Krishna
onde quer que eu fosse, mesmo se eu tivesse que cantar para as quatro paredes.
E, porque muitos gurukulis amam kirtan mas não gostam de cantar suas japas
(canto meditativo), ele acrescentou, ‘Certifique-se de cantar suas dezesseis voltas por dia, de outro modo
seu kirtan não terá nenhum poder.’”
“Faça
Tantos Kirtans 24-Horas Quanto Possível”
Agora, vivendo na Suíça, Madhava
continuou a manter contato com Aindra ao longo dos anos e continuou recebendo
muitas destas instruções, incluindo justamente a última, durante uma Conversa
por Skype em 16 de Julho de 2010.
“Eu estava prestes a embarcar em dois
kirtans 12-horas seguidos, liderando o Festival de Ratha Yatra em Toronto,
Canadá, e eu lhe pedi suas bênçãos,” diz Madhava. “Sua última instrução pra mim
foi, ‘Por favor, vá em frente e faça tantos kirtans 24-horas ao redor do mundo
quanto possível.’”
Justo no dia seguinte, Madhava recebeu
a chocante notícia de que Aindra tinha partido em Vrindavana, enquanto adorava
suas Deidades.
“É muito duro pra eu digerir” diz ele
agora. “Eu sentirei saudades dele pelo resto de minha vida. Mas ele viverá para
sempre em seus kirtans e em suas instruções. Eu estou tentando seguir sua
última instrução a mim fazendo kirtans 24-horas por todo o mundo: Nós faremos
um em New Vraja Mandala na Espanha em 13 e 14 de agosto, um no Peru em 25 e 26
de setembro e um em Alachua, Flórida, neste Novembro. E claro, muitos outros
devotos estão também mantendo festivais de Kirtan 24-Horas e eventos ao redor
do mundo.”
Madhava se comprometeu também a
participar do kirtan 24-horas original de Vrindavana por um mês todo ano, num
futuro próximo. “Eu encorajo outros devotos a também sacrificarem qualquer
tempo que eles possam todo ano a satisfazer a missão de Aindra e de Srila
Prabhupada,” ele diz. “Agora que o pai se foi, é o verdadeiro teste para as
crianças mostrarem seu amor por kirtan e nosso amor por Aindra Prabhu.”
A razão adoece daquele que diz que Vaishnavas
morrem,
Quando
tu estás ainda vivo em som!
Os
Vaishnavas morrem para viver, e vivem tentando
Propagar os santos nomes em todo lugar.
--Srila Bhaktivinode Thakur
Nota do Autor: As informações, datas e
relatos aqui são o mais preciso que eu pude apresentá-los dentro do curto tempo
disponível para submeter este artigo. Eles foram dados a mim pelas pessoas
citadas e eu apresentei suas palavras tão fielmente quanto possível. Muitos
agradecimentos a Padma-Malini Dasi pela sua história sobre o primeiro encontro
de Aindra com os devotos.
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